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As ameaças a prefeitos alemães que enfrentam a ultradireita

Bettina Stehkämper
15 de abril de 2024

Consulta indica que mais de 40% dos políticos locais já sofreram ofensas, ameaças ou até agressões devido à função que desempenham. Mas o país está tomando atitudes para defender a democracia.

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Funeral de político alemão Walter Lübcke
Para o governador Walter Lübcke, de Kassel, luta pela democracia acabou em morte, em 2019Foto: Swen Pförtner/dpa/picture alliance

A Alemanha conta quase 11 mil prefeitos, a maioria dos quais trabalhando em regime não remunerado. E o fato de serem o rosto da política in loco não impede que sofram constantemente agressões graves. Ao ponto de, em 11 de abril, o presidente Frank-Walter Steinmeier convocar mais de 80 líderes municipais honorários para escutar seus problemas e ansiedades.

O chefe de Estado alemão advertiu: "Quando prefeitos e conselheiros municipais não podem mais abordar certos temas sensíveis, quando fecham as próprias contas nas redes sociais ou até renunciam ao cargo ou mandato a fim de proteger sua família de hostilidades, quando indivíduos que gostariam de se candidatar desistem para não ser alvo de ódio, aí quem é democrata não pode simplesmente dar de ombros e aceitar."

Coorganizadora do encontro, a Fundação Köbler encomendou uma consulta representativa ao instituto de pesquisa de opinião Forsa. Ela revelou que 40% dos políticos locais ou pessoas próximas deles já foram ofendidos, ameaçados ou mesmo agredidos fisicamente devido à sua função. Por essas experiências, mais de um quarto dos prefeitos honorários indagados já considerou retirar-se da política, temendo pela própria segurança. Além disso, quase dois terços registram descontentamento e insatisfação crescentes entre os cidadãos de suas comunidades.

Para 35%, nos próximos anos o extremismo de direita será um grande desafio em sua cidade. Quase um quinto relata sobre o avanço de tendências antidemocráticas – no Leste essa proporção chega a um quarto. Esse resultado preocupa sobretudo em face das três eleições estaduais no território da antiga Alemanha comunista, em setembro.

Deutschland Bundespräsident Steinmeier
Presidente Frank-Walter Steinmeier alerta: "Quando prefeitos até renunciam ao cargo para proteger suas famílias, aí quem é democrata não pode simplesmente dar de ombros e aceitar."Foto: Bundespräsidialamt/dpa/picture alliance

Das ofensas ao assassinato

Em fevereiro, o social-democrata Michael Müller vivenciou de perto esse risco, em sua cidade natal, Waltershausen, no estado da Turíngia, quando alguém incendiou seu carro, e o fogo se espalhou para a fachada da casa. O político comunal havia fornecido abrigo a uma família com duas crianças, que felizmente pôde se salvar. Segundo a perícia, tratou-se uma tentativa de assassinato intencional, que agora está sob investigação policial.

Müller não acredita que foi acaso ele ter convocado, dias antes, uma manifestação contra o extremismo de direita. Tais agressões o preocupam seriamente, pois "muitos se perguntam se 'vale a pena sacrificar o meu tempo livre por essa sociedade que, em contrapartida, me ameaça?'" Ele teme que em algum momento "vai haver cada vez menos gente que sacrifica seu lazer e trabalha como conselheiro municipal, comunal, prefeito honorário": "Aí eles vão preferir fazer algo divertido com a família."

Uma pesquisa representativa realizada no âmbito da iniciativa Rede de Competência contra o Ódio na Rede confirma uma tendência semelhante nos debates dentro do espaço digital: quanto mais eles se brutalizam, mais internautas se retiram da discussão online.

A prefeita de Colônia, Henriette Reker, escapou por pouco da morte em 2015: um dia antes da eleição, um radical de direita fanático a esfaqueou na garganta. Andreas Hollstein, prefeito da cidadezinha de Altena, na Renânia do Norte-Vestfália, foi também apunhalado na garganta dois anos mais tarde, por um inimigo dos refugiados.

O assassinato do governador de Kassel Walter Lübcke, por um neonazista, abalou grande parte do país em 2019. Pouco a pouco chega ao grande público o que sofrem alguns políticos locais no exercício de seu cargo: forcas postadas em frente de casa, cadáveres de animais na caixa de correio, cartas de ódio em que se afirma saber onde os filhos estudam.

Refugiados em posto de acolhimento do estado alemão de Brandemburgo
Muitos na Alemanha, sobretudo no Leste, não admitem a presença de refugiados e migrantesFoto: Patrick Pleul/dpa/picture alliance

O motor da democracia não pode engasgar

Para aguentar, só estando tão convicta do próprio trabalho político quanto a prefeita da cidade de Zossen, em Brandemburgo, Wiebke Şahin-Schwarzweller. Já durante sua campanha eleitoral, em 2019, ela sofria ameaças: "Também o meu marido, que é de descendência turca, foi alvo de calúnias voltadas contra mim."

Porém a deputada liberal se defende, e tornou-se um dos políticos que desde 2018 o presidente Steinmeier consulta sobre o assunto. Pois, ao contrário das figuras de ponta, os representantes comunais não são devidamente protegidos por limusines blindadas, guarda-costas nem leis.

Por isso lutam para estar pelo menos bem conectados em rede e informados, a fim de poder se defender. Um dos endereços é o portal Stark im Amt (Fortes no cargo), que oferece suporte a políticos locais. Promotores, policiais e autoridades estão sensibilizados sobre o assunto.

Em março de 2022, o governo federal alemão apresentou dez medidas de um plano de ação contra o extremismo de direita, entre as quais consta a proteção de mandatários. Para tal, em meados de 2024 será criada uma nova central federal para os políticos comunais sob ameaça.

O responsável pela implementação é Marcus Kober, do Fórum Alemão para Prevenção Criminal (DFK), que explica: "Um primeiro passo muito importante é combater a sensação de estar sozinho para lidar com a situação." O segundo é esclarecer se se trata de um delito, qual órgão é responsável, e identificar as ofertas num sistema de assistência que hoje é bastante desenvolvido.

Kober está convicto de que os representantes comunais precisam urgentemente de proteção, pois são quem responde por todas as decisões nos níveis estadual ou federal. Para ele, trata-se do motor essencial do sistema democrático: quando ele engasga, a democracia está em perigo.